Responsabilização individual na governança corporativa: Entenda as abordagens em Singapura, Hong Kong e Austrália

Nos últimos anos, a responsabilização individual ganhou mais espaço na agenda das autoridades prudenciais em detrimento de multas para as instituições como um todo. Nesse sentido, o BIS lançou um documento explorando os regimes de responsabilidade individual, destacando os casos de Hong Kong, Singapura e Austrália.
Responsabilização individual na governança corporativa: Entenda as abordagens em Singapura, Hong Kong e Austrália
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Equipe Propague
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Nos últimos anos, de acordo com o BIS, os mecanismos de responsabilização individual começaram a ganhar mais espaço na agenda das autoridades prudenciais e organismos reguladores globais. Isto é, identificar e responsabilizar indivíduos em cargos de liderança por suas ações, decisões ou omissões, se tornou uma tendência das autoridades competentes.

Até então, as autoridades prudenciais respondiam à falhas na governança corporativa impondo multas financeiras aos bancos. Esse tipo de “punição” foi escolhido, principalmente, porque as multas são uma ferramenta mais simples de serem gerenciadas.

Essa mudança de tendência entre os organismos globais pôde ser observada, por exemplo, no Comitê de Supervisão Bancária de Basileia (BCBS) que emitiu suas diretrizes revisadas sobre princípios de governança corporativa para bancos, em 2015, e no Conselho de Estabilidade Financeira (FSB) que publicou uma revisão das estruturas de governança para reduzir o risco de má conduta em 2017.

É interessante notar, também, que a responsabilização individual não é só uma demanda de reguladores e supervisores. Isso significa que, com aumento das multas e acordos pagos também pelas empresas, houve um maior interesse das instituições financeiras em lidar com atividades e ações de má conduta de forma mais responsável e eficiente.

Dado o contexto, o BIS lançou um documento esboçando os contornos dos quadros regulatórios que governam a supervisão da responsabilidade individual, além de explorar os desafios de implementação.

Na discussão estão presentes dois país asiáticos, Hong Kong e Singapura, além da Austrália que, apesar de pertencer a Oceania, guarda relações próximas com o que ocorre na Ásia.

Abordagens de responsabilização individual e suas características gerais

Entre esses países, a Austrália foi o primeiro a apresentar um quadro de responsabilização individual, seguida por Singapura, em 2021. Já Hong Kong não conta com um quadro formal, porém, possui mecanismos independentes para cumprir essa função.

Para fins analíticos, o BIS diferencia esses países em duas abordagens amplas:

  1. A introdução de regimes autônomos consolidados de “responsabilidade individual” (Austrália e Singapura);
  2. A ausência de um quadro formal e a dependência de quadros regulamentares mais amplos para responsabilizar os indivíduos (Hong Kong).

No primeiro grupo, em geral, estão as jurisdições que possuem regimes focados nos executivos, marcados pela definição de responsabilidades específicas para esses indivíduos e pela exigência de declarações de responsabilidade e mapas de responsabilidade em toda a empresa.

Ademais, os indivíduos cobertos por esses regimes podem ser responsabilizados por falhas em suas áreas de responsabilidade, exceto no caso de terem tomado medidas razoáveis para preveni-las. Isso permite aos supervisores identificar rapidamente os responsáveis por problemas e responsabilizá-los se necessário.

Em contrapartida, no segundo tipo de abordagem as similaridades são menores e os mecanismos de responsabilização variam com maior intensidade entre os casos analisados.

Alguns dos possíveis mecanismos adotados incluem regras de conduta básicas, políticas para proteger funcionários que denunciam má conduta e restrições ao uso de seguros para compensar multas financeiras impostas aos executivos.

Austrália planeja lançar um novo regime para responsabilização individual

Em 2018, a Austrália adotou o Regime de Responsabilidade Executiva Bancária Australiano (BEAR). Inicialmente, essa medida era aplicada apenas às quatro maiores Instituições Autorizadas a Captar Depósitos (IACD) domésticos, mas, em julho de 2019, a abrangência foi estendida para todos os IACDs.

Com o BEAR, ficou estabelecido que os IACDs precisariam informar a Autoridade Australiana de Regulação Prudencial (APRA) sobre a identidade e responsabilidades de cada parte afiliada.

Além disso, essas instituições deveriam apresentar um mapa mostrando como as responsabilidades de todas as partes afiliadas (PAs) à instituição cobrem os aspectos das operações do IACD.

Por fim, o BEAR impõe obrigações de responsabilidade tanto aos IACDs quanto às partes afiliadas, de modo que a remuneração das PAs é explicitamente vinculada à responsabilidade com a remuneração variável sendo reduzida caso um PA não cumpra suas obrigações.

Recentemente, um novo Regime de Responsabilidade Financeira (FAR) está em desenvolvimento e com intenção de substituir o BEAR e, se for adotado, estenderá o quadro de responsabilização a todas as entidades reguladas pela APRA, como, por exemplo, empresas de seguros. Além disso, o FAR seria supervisionado em conjunto pela APRA e pela Comissão Australiana de Valores Mobiliários e Investimentos (ASIC).

Singapura já conta com um regime de responsabilização individual em vigor

O Regime de Responsabilização Individual (RRI) de Singapura, por sua vez, foi emitido em setembro de 2020 e está em vigor desde setembro de 2021. Ele assume a forma de Diretrizes de Responsabilidade Individual e Conduta (IAC GL) e estabelece cinco resultados-chave que as instituições reguladas devem alcançar.

O primeiro resultado-chave específica que os gerentes sêniores responsáveis pelas funções de gestão central (CMFs) devem ser claramente identificados, com registros internos atualizados e abrangentes acerca dos seus papéis e responsabilidades.

O segundo e o terceiro resultado estão alinhados ao garantir que esses cargos de gerência sejam ocupados por indivíduos aptos e adequados, além de ser esperado que a estrutura de governança seja desenhada para apoiar o desempenho de seus papéis e responsabilidades, de forma clara e transparente.

Já os resultados quatro e cinco exigem que as instituições financeiras estabeleçam uma governança eficaz de risco, com estruturas de incentivo e padrões de conduta estendidas a todos os funcionários.

Hong Kong adota uma abordagem mista

Dos países apresentados, Hong Kong é o único que não conta com um regime regulatório geral, adotando uma abordagem mista que combina certos recursos das responsabilidades Individuais com outras abordagens de responsabilização.

As empresas não bancárias licenciadas que se envolvem em negócios de valores mobiliários e gestão de fundos, por exemplo, desde 2016 contam com o Manager-in-Charge (MIC), exigindo que as empresas nomeiem um “gerente responsável”. Esse regulamento foi estabelecido pela Comissão de Valores Mobiliário e Futuros (SFC).

Ademais, em 2017, a Autoridade Monetária de Hong Kong (HKMA) emitiu um comunicado estabelecendo que os bancos envolvidos em atividades regulamentadas, identifiquem pelo menos um indivíduo responsável pela:

  • Gestão geral do negócio como um todo;
  • linhas de negócio específicas e funções intermediárias.

Por fim, a Reforma da Cultura Bancária de 2017 foi introduzida, de forma complementar, para promover uma cultura sólida voltada para uma gestão prudente de riscos e para incentivar um comportamento adequado dos funcionários.

 

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