Inverno Cripto: congelamento do mercado ou primavera à vista?

Inverno cripto, desencadeado pelo colapso da Terra/LUNA, gerou queda no preço das criptomoedas. Apesar da crise, o mercado pode estar vendo a primavera chegar e as expectativas são de que essa nova estação trará readequações e foco na regulação do setor.
Inverno Cripto: congelamento do mercado ou primavera à vista?
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Morgana Tolentino
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Quem assistiu Game of Thrones sabe que o início da série é marcado pelo alerta de que “o inverno está chegando”. Isso porque, no mundo fantástico de Westeros, os invernos rigorosos duram anos e as pessoas precisam se preparar para saírem vivas dele. Já no mundo real, o inverno dura poucos meses e é substituído pela primavera, a estação das flores. 

O universo das criptomoedas viu o inverno chegar com o colapso da stablecoin Terra/LUNA, em maio de 2022, o que gerou uma grande crise no mercado, com quedas drásticas nos preços de diversas criptomoedas. Alguns especialistas já vinham anunciando que essa crise chegaria e, assim como os personagens de Game of Thrones, alertavam para um inverno longo e duradouro que congelaria o mercado cripto. Por outro lado, há quem veja essa crise como um processo natural do qual o mercado sairá mais forte para colher as flores da primavera. 

Hoje, pouco mais de quatro meses após a falência da Terra/LUNA, se ainda não há exatamente flores no horizonte das criptomoedas, pelo menos o inverno não parece tão rigoroso quanto previam os mais alarmistas.

Inverno cripto: intenso o suficiente para congelar o mercado?

Diversos especialistas demonstravam desconforto e desconfiança com o crescimento do mercado de criptomoedas. Paul Krugman, prêmio Nobel de economia em 2008, alertou  para os riscos do mercado, sobretudo com relação ao investidor de varejo, uma vez que se trata de ativos de altíssimo risco, com caráter puramente especulativo e alta volatilidade de preços. Além disso, a situação desregulamentada do mercado cripto faz com que seja hoje um ambiente amplamente usado para transações ilícitas de evasão de divisas, lavagem de dinheiro, financiamento ao terrorismo, entre outros. 

Diante desse cenário, muitos defendiam que o mercado cripto seria uma espécie de grande bolha, com transações de ativos puramente especulativos, sem respaldo em ativos de valor real para a economia, e amplamente usadas para fins ilícitos. Essa visão sugere uma leitura de que, assim que a bolha estourasse, o mercado perderia totalmente a relevância que vinha alcançando no cenário financeiro. 

O colapso da stablecoin Terra/LUNA, que desencadeou uma queda generalizada nos preços das criptomoedas, parecia ser esse estouro da bolha, inaugurando o longo inverno cripto, a crise da qual o mercado não se recuperaria. É verdade que as quedas foram substanciais. O Bitcoin e o Ether, as duas maiores criptomoedas em termos de capitalização no mercado, viram seus preços despencarem. A primeira teve um pico de preço de mais de USD 46 mil no ano de 2022 e uma queda para menos de  USD 19 mil após a crise da Terra. Já a segunda saiu de um pico de preço de aproximadamente USD 3500 em abril de 2022 para menos de USD 1000 em junho do mesmo ano. 

O mercado cripto já tinha passado por outras baixas. A crise da Terra/LUNA, contudo, quebrava a confiança nas stablecoins (criptomoedas que prometem menor volatilidade de preços por funcionarem em paridade com o preço de um ativo pré-determinado) e parecia jogar o mercado em um profundo abismo após seu período de maior sucesso vivido no final de 2021. Aqueles mais céticos que anunciaram que o “inverno estava chegando”, então, já tiravam do armário seus casacos mais pesados: o inverno tinha chegado e o mercado iria congelar. 

Regulação pode aquecer o mercado, sugerindo a chegada da primavera

De fato, o inverno cripto se mostrou relevante, com expressivas perdas para os investidores e queda total da captação do mercado (aproximadamente USD 815 bi pós crise, frente a cerca de USD 2 tri no início do ano). A perda de confiança nas stablecoins reforçou a volatilidade nos preços das criptomoedas em geral, mas, apesar disso, o mercado parece estar se readequado em um nível de preços mais baixo. O Bitcoin, por exemplo, desde julho deste ano está se mantendo em uma média de preço próxima aos USD 20 mil, sem cair muito abaixo desse patamar. A queda da euforia com as criptomoedas é perceptível, mas isso não necessariamente decreta a falência do mercado e a resposta das autoridades pode ser uma aliada para a manutenção do mercado.

O inverno cripto parece ter pressionado as autoridades a agilizarem suas agendas de regulamentação do mercado. Projetos tramitam hoje no Brasil, nos EUA, no Reino Unido, no Parlamento Europeu, no Japão, entre outras jurisdições. Para além de um marco legal para criptoativos em geral (um processo comumente mais demorado), diversas jurisdições já publicaram normas para casos específicos, como é o caso do Japão que decretou que stablecoins só podem ser emitidas por instituições registradas e que garantam o lastro do ativo. 

A regulamentação do mercado agrada diversos participantes, pois garante a segurança jurídica e institucional para o setor, mitigando o risco de exposição a transações com fundos ilícitos, responsabilização por fraudes, garantias de lastro em ativos que o prometem etc. Além disso, integrantes do mercado acreditam que depois dessa crise, investidores estarão mais atentos e mais cautelosos com relação ao ambiente das criptomoedas. 

A volatilidade de preços e o caráter especulativo do mercado já eram apontados como dois dos principais riscos de participação no mercado, mas a falta de cumprimento de normas de proteção ao investidor e forte apelo publicitário, fazia os investidores de varejo entrarem no mercado com pouco ou nenhum conhecimento sobre suas funcionalidades e riscos. Isso sugere que a regulação também deve focar na proteção ao investidor, na tentativa de mitigar grandes perdas para esse perfil. Nesse sentido, é importante definir o grau de risco dos criptoativos (alto) para limitar a exposição a esses riscos.

Portanto, a regulamentação, se bem desenhada, pode ser uma aliada para a construção de um mercado forte de criptoativos, com responsabilização em casos de fraudes e outras ilegalidades e procedimentos para o gerenciamento adequado dos riscos envolvidos no setor. 

Dessa maneira, os mais confiantes acreditam que a crise pode terminar sendo benéfica, uma vez que acendeu o senso de urgência das autoridades em regular o mercado, o que deve trazer institucionalidade para as operações e reduzir a participação de agentes mal intencionados, visando transações ilícitas. Assim, o andamento de projetos regulatórios para o ambiente das criptomoedas pode ser o Sol que aquecerá o inverno cripto, levando o mercado para uma florida primavera.

Morgana Tolentino é pesquisadora do Instituto Propague e mestra em Economia pela UERJ.

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@instpropague Como os caminhos de Westeros se conectam com o universo de criptoativos? Entenda o cenário atual do inverno cripto! #GoT #gameofthrones #houseofthedragon #criptomoedasbr ♬ Game of tones (cinematic orchestration) – GhostWithin

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