Regulação cripto avança, apesar das distintas visões sobre o mercado

Em meio a um debate ainda sem consenso e com os países traçando caminhos diferentes, a regulação dos ativos criptográficos ganha novos capítulos nas principais economias globais.
Regulação cripto segue avançando apesar das distintas visões sobre o mercado
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Equipe Propague
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Embora o otimismo com as criptomoedas esteja crescendo entre gestores de ativos em todo o mundo, a volatilidade, ainda mais acentuada na primeira metade de 2022, continua sendo o principal argumento de muitos bancos para não incluir a classe de criptoativos em seus portfólios de produtos. Porém, mesmo observando posicionamentos distintos em relação à criptografia, uma coisa é certa: as tecnologias blockchain inevitavelmente farão parte do futuro do mercado financeiro. Diante disso, o debate sobre o mercado e a adoção de medidas envolvendo a regulação cripto seguem avançando em várias jurisdições.

E há sinais claros nessa direção. Vários gigantes do mercado de criptomoedas seguem atentos e têm se movimentado, lançando novas ofertas para aquisição de players em ascensão.

Esse ânimo se justifica, levando em conta, por exemplo, os dados da Coinshares, gestora britânica de criptoativos. Segundo a empresa, os produtos de investimento em ativos digitais registraram sua sexta semana consecutiva de fluxos positivos, revertendo a saída acumulada de recursos no ano para uma entrada líquida de US$ 490 milhões em meados de agosto.

Em contraste, o nível de interesse que se observa no meio de gestores de ativos se manifesta de forma diferenciada entre os bancos, que, cautelosos, divergem sobre adicionar produtos e serviços de criptografia à oferta de seus clientes.

No entanto, independentemente do grau de entusiasmo dos players do setor, autoridades monetárias de algumas das grandes economias globais continuam se movimentando em direção à consolidação da regulação cripto diante do interesse irremediável nessa classe de ativos e a consequente interação com o mercado financeiro tradicional.

UE reforça regulação cripto apostando em nova entidade

Pouco tempo depois de ter acrescentado medidas mais restritas em relação à regulação cripto, como regulamentos anti-anonimato, que aumentariam o custo e a dificuldade das transações entre carteiras e exchanges não hospedadas, a União Europeia (UE) anunciou planos para criar uma sexta Autoridade Antilavagem de Dinheiro.

O novo órgão, chamado AMLD6, está sendo gerido pelo Parlamento, o Conselho Europeu e pela Comissão Europeia e será encarregado, especificamente, de regular o setor de criptomoedas.

A ideia é de que a proposta seja discutida em setembro de 2022, após o recesso de agosto, quando os três órgãos iniciarão o que chamam de trílogos, que ocorre logo após cada um deles aprovar a sua versão individual da nova regulação cripto.

O que se sabe, até então, é que a AMLD6 seria responsável por acompanhar os fornecedores de serviços de criptografia, principalmente aqueles classificados como de alto risco. Além disso, diferentemente das regulamentações anteriores contra a lavagem de dinheiro, que se concentravam em oferecer as estruturas para os países do bloco captarem e compartilharem informações, a expectativa é de que esse novo regulador determine o potencial de arbitragem entre as jurisdições dentro da UE.

De acordo com o Parlamento, o novo sistema fornecerá essa supervisão mediante o modelo denominado hub and spoke. Em outras palavras, baseado na conexão de origens e destinos através de um ponto intermediário. Na prática, isso corrobora a criação da nova entidade, com a competência de supervisionar e coordenar diretamente as instituições financeiras e o setor não financeiro como um primeiro passo.

Leia também: Sustentabilidade das criptomoedas: o que pretende a UE no âmbito da regulação

Nos EUA, FED emite orientação para bancos sobre atividades com criptografia

Apesar de se encontrar em um estágio bem anterior ao da UE em relação ao debate e a adoção de medidas sobre a criptografia, os Estados Unidos vêm dando, aos poucos, pequenos acenos em relação à consolidação de uma regulação cripto.

Inicialmente, em dezembro de 2021, as agências federais norte-americanas emitiram uma declaração sobre política regulatória para bancos. Mais recentemente, o Federal Reserve (FED), em específico, divulgou orientações adicionais para os bancos que consideram iniciar atividades com criptomoedas.

A principal recomendação é que aqueles que se encaixem nesse cenário devem notificar previamente o FED e garantir que tudo seja legalmente permitido. Ao mesmo tempo, quaisquer bancos que já tenham buscado iniciativas no universo cripto também devem informar sobre o seu envolvimento.

Para a autoridade monetária, embora as criptomoedas possam apresentar “oportunidades potenciais” para as instituições financeiras, elas precisam assegurar que tenham sistemas e controles previamente estabelecidos, a fim de garantir que a volatilidade não ameace a segurança e a solidez do sistema financeiro ou a proteção do consumidor.

Além disso, o Fed também encoraja os bancos supervisionados a alertarem os reguladores estaduais antes de se envolverem em atividades com criptomoedas.

Vale lembrar que em julho de 2022, o vice-presidente do FED, Lael Brainard, chegou a falar em um discurso, sobre a importância de ter as bases para uma regulação cripto definidas de imediato. “Antes que o ecossistema criptográfico cresça demais ou se torne interligado com o sistema financeiro tradicional, podendo representar riscos para a estabilidade financeira”,  afirma.

ONU faz recomendações acerca da regulação cripto nos países em desenvolvimento

Enquanto a UE e os EUA traçam caminhos para a regulação cripto, a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD, na sigla em inglês), por outro lado, pede, além de leis mais abrangentes, a limitação do avanço das criptomoedas em países em desenvolvimento.

O órgão, que promove os interesses dessas nações no comércio mundial, defende que as criptomoedas ameaçam potencialmente a estabilidade financeira, a destinação de capital e recursos e a segurança dos sistemas monetários nesse grupo de países.

Dessa forma, a UNCTAD pede a esses países que diminuam a divulgação de criptomoedas e introduzam uma regulação cripto robusta, abrangendo as trocas desses ativos, carteiras digitais e outras particularidades das finanças descentralizadas (Defi). Ao mesmo tempo, chega a sugerir que se proíba as instituições financeiras de manterem criptomoedas.

Já em nível global, a entidade propõe a aplicação de uma estrutura tributária internacional abrangendo criptomoedas, regulação e partilha de informações. Conforme a organização, a criptografia, pode “comprometer a soberania monetária das nações”.

A UNCTAD cita, inclusive, as stablecoins, as quais, afirma, trazem “riscos em específico para países em desenvolvimento com uma procura não atendida por moedas de reserva”. Como alternativa, o órgão recomenda a implementação de sistemas de pagamento digitais domésticos, cumprindo, assim, o papel de “bem público” das criptomoedas, limitando sua expansão.

Ao mesmo tempo, aponta que as autoridades monetárias podem implantar moedas digitais de banco central (CBDCs) ou sistemas de pagamento instantâneo de varejo, ao passo que solicita que a emissão e a distribuição do dinheiro físico sejam mantidas.

E no Brasil, qual o cenário?

Quando os olhares se voltam para o Brasil, a regulação cripto segue em grau mais avançado do que em outros países. Atualmente, a matéria tramita na Câmara dos Deputados, esperando apenas o aval do Plenário para seguir para a sanção da Presidência da República.

Nesse meio tempo, o presidente do Banco Central do Brasil (Bacen), Roberto Campos Neto, reforça a necessidade da regulação cripto no país, ao afirmar que ela é relevante no sentido de unir criptoativos ao Open Finance, ao sistema de pagamentos instantâneo brasileiro, o Pix, e ao real digital.

Conforme disse, a regulação cripto deve seguir um posicionamento proativo e considerar como os criptoativos podem modificar positivamente a intermediação financeira, interagindo com o sistema financeiro tradicional. A declaração aconteceu durante palestra em um evento sobre a regulamentação de ativos criptográficos no Brasil.

Para o mandatário do Bacen, os criptoativos surgiram a fim de responder a uma demanda da população sobre pagamentos mais baratos, rápidos, transparentes, abertos e integrados e que isso ganhou novos contornos com a adoção de um sistema de contratos inteligentes, o que tornará a economia mais “tokenizada”.

Ainda de acordo com Campos Neto, o sistema financeiro brasileiro, de certa forma, já possui uma CBDC, por assim dizer, “sintética”, ao se referir às distintas formas de pagamento e utilização da moeda nacional no ambiente digital – TED, DOC e Pix.

Assim, a proposição do Bacen com a regulação cripto é unir o sistema financeiro tradicional, que já opera digitalmente, com o ecossistema de criptoativos, criando um sistema interoperável, capaz de usufruir das vantagens do que chamou de dinheiro programável.

“A proposta é interligar tudo na forma de carteira digital – pagamentos, Open Finance, stablecoins, depósitos tokenizados, monetização de dados e ter um caminho comum baseado no dinheiro programável com protocolos abertos”, afirmou.

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