Como resposta aos riscos climáticos e ambientais, governos e empresas se empenham cada vez mais em direção a uma economia carbono zero. Contudo, embora existam diversas pesquisas relacionadas à transição para o alcance dessa condição, os impactos socioeconômicos não vêm sendo considerados em escala e complexidade suficientes a fim de garantir uma trajetória mais equitativa e inclusiva.
Essa é a conclusão a que chegou uma pesquisa assinada por autoridades sênior dos escritórios da McKinsey ao redor do mundo. Os autores desenvolveram uma Estrutura de Impacto da Transição Climática (C-TIF na sigla em inglês) para suprir essa lacuna.
A partir da análise de valor e viabilidade de aproveitamento dos cenários climáticos existentes, os pesquisadores se dedicaram a compreender os impactos socioeconômicos do caminho a percorrer para o alcance de uma economia carbono zero, o que resultou no desenvolvimento de métricas associadas.
Essa Estrutura foi debatida por mais de 40 líderes climáticos na mais recente Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP28 realizada em Dubai.
Entre eles, representantes da Absa, grupo de serviço financeiro africano; da Comissão de Transições Energéticas; da IFC, entidade ligada ao Banco Mundial; da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD); e do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD).
Principais propostas para alcançar o carbono zero
Segundo os autores, o C-TIF pretende fornecer informações para orientar os compromissos que os decisores devem considerar para alcançar ordenadamente a meta de limitar o aumento da temperatura do planeta em 1,5Cº até 2030, conforme determina o Acordo de Paris, e, ainda, o cenário de carbono zero.
O caminho a seguir incluiria o aperfeiçoamento contínuo mediante a contribuição de um amplo conjunto de partes interessadas, testes práticos com instituições e governos e a definição de uma coligação multipartidária para conduzir esse conceito e torná-lo um trunfo para a comunidade global.
Afinal, a enorme escala do desafio climático exige que os decisores equilibrem compromissos significativos e adotem novas ferramentas para fornecer uma perspectiva matizada, multidimensional, socioeconômica e empírica rumo a uma economia carbono zero, explicam os formuladores do C-TIF.
As ferramentas e as investigações atualmente disponíveis para apoiar a questão avaliam os impactos socioeconômicos de uma multiplicidade de ângulos diferentes, mas muitas vezes sem interligar dimensões como a saúde e o custo da energia, ou seja, sem uma visão mais holística dos impactos da transição sobre as pessoas.
Nesse sentido, o C-TIF tem como dimensões: energia acessível, mediante custo e segurança; saúde e meio ambiente, considerando a experiência cotidiana e seus resultados; alocação dos investimentos necessários para apoiar a transição carbono zero; impacto nos empregos e como as mudanças se distribuem pela população; e crescimento, produtividade e competitividade dos meios de subsistência.
Além de uma visão mais abrangente dos impactos socioeconômicos por meio dessas dimensões e de um conjunto de métricas atreladas, resultando em uma análise quantitativa e qualitativa mais robusta, a C-TIF também considera uma abordagem flexível a fim de contemplar e ampliar variados cenários climáticos.
Custos e implicações para um cenário carbono zero
Complementarmente ao C-TIF, outro estudo conduzido por pesquisadores da McKinsey destaca os custos relativos aos ajustes econômicos e sociais atrelados à transição para uma economia carbono zero.
Segundo a publicação, tais ajustes poderiam ser significativamente maiores e mais dispendiosos no caso de uma transição desordenada, atrasada ou abrupta. Qualquer uma dessas situações resultaria no risco de encalhamento de ativos físicos, perdas de postos de trabalho e reações negativas capazes de atrasar a transição.
Além do mais, embora a transição para um cenário carbono zero deva ser universal, significativa e antecipada, seus efeitos seriam desiguais nos diversos setores, localidades e comunidades, mas também criaria oportunidades de crescimento.
O estudo também fornece estimativas quantitativas das mudanças econômicas que ocorreriam na transição para um cenário carbono zero, consistente com a meta de limitar o aquecimento global em 1,5°C.
Uma delas é de que os gastos em ativos físicos necessários seriam bem superiores às projeções de despesas totais que análises anteriores indicaram.
Nesse sentido, estima-se que os desembolsos em ativos físicos para a geração de energia e utilização do solo na transição para um cenário zero carbono somariam aproximadamente US$ 275 trilhões até 2050, ou cerca de US$ 9,2 trilhões, anualmente, em média.
Nesse cenário, o custo médio mundial de fornecimento de eletricidade cresceria no curto prazo, mas depois se reduziria a partir desse pico, embora houvesse variação entre as regiões.
Ao mesmo tempo, a expectativa é de que os custos de capital e a depreciação de ativos novos e existentes poderia aumentar mundialmente, em média, cerca de 25% até 2040, ficando na casa dos 20% em 2050.
No entanto, a inovação tecnológica seria capaz de diminuir os custos de capital para tecnologias com emissões carbono zero de forma mais rápida do que o esperado.
Ganhos e perdas no mercado de trabalho
Em relação ao mercado de trabalho, a transição para uma economia carbono zero poderia trazer cerca de 200 milhões de novos postos de trabalho diretos e indiretos, mas, por outro lado, também poderia ocasionar uma perda de aproximadamente 185 milhões de colocações em escala global até 2050.
Isso inclui a busca por trabalho em operações e construção de ativos físicos voltados para produção de energia renovável, hidrogênio e biocombustíveis. No entanto, os trabalhadores deslocados necessitariam de apoio, formação e requalificação durante a transição.
Ademais, apesar da transição criar oportunidades, os setores com produtos ou operações com elevadas emissões – que respondem por cerca de 20% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial – enfrentariam efeitos substanciais na procura, nos custos de produção e no emprego.
Nesse contexto, a produção de carvão para utilização energética quase se extinguiria em 2050. Já as de petróleo e gás seriam cerca de 55% e 70% menores, respetivamente, em relação aos valores atuais.
Além disso, as alterações nos processos aumentariam os custos de produção em outros setores, a exemplo do aço e do cimento que se confrontariam com altas em torno de 30% e 45%, respectivamente, até 2050.
Por fim, os países mais pobres e aqueles que dependem de combustíveis fósseis estariam mais expostos às mudanças em uma transição para carbono zero, embora também tenham perspectivas de crescimento. Esses países são mais suscetíveis a alterações na produção, no estoque de capital e no emprego, porque os setores citados correspondem a parcelas relativamente significativas de suas economias.
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