Cidadania financeira: o que significa e qual a sua importância para o país

No contexto atual, o exercício pleno da cidadania não é garantido estando à margem do sistema financeiro. Entenda o que isso implica, quais as estratégias para a sua promoção e como o Brasil se posiciona.
Cidadania financeira: o que significa e qual a sua importância para o país
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Equipe Propague
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No mundo atual, onde os países experimentam uma crescente financeirização de recursos econômicos essenciais para o bem-estar e a prosperidade da população, o conceito de cidadania se ampliou. Concebida como direito de as pessoas participarem das decisões que afetam a sua vida tendo como contrapartida um comportamento responsável dentro da sociedade, hoje o exercício pleno da cidadania é dificultado (ou mesmo impossibilitado) na medida em que se está à margem do sistema financeiro. A ideia de cidadania financeira surge desse reconhecimento da relevância da participação ativa e consciente no sistema financeiro como condição relevante para o exercício do papel do indivíduo na sociedade, tanto demandando direitos como exercendo deveres.

O termo ganha ainda mais força quando se leva em consideração a quantidade cada vez maior de produtos e serviços financeiros disponíveis devido ao avanço sem precedentes da tecnologia e inovações regulatórias no setor.  Em um mundo cada vez mais conectado e com os serviços financeiros refletindo cada vez mais essa realidade, estar excluído desses espaços pode ter consequências consideráveis para a capacidade de participação na sociedade e no bem-estar individual.

O que é cidadania financeira

Segundo o BC, cidadania financeira pode ser definida como “o exercício de direitos e deveres que permite ao cidadão gerenciar bem seus recursos financeiros”. Nesse contexto, explica a autoridade monetária, o gerenciamento adequado desses recursos remete a planejar o seu uso, gerenciar a utilização do crédito e poupar de forma ativa.

Além de ter acesso a produtos e serviços financeiros de acordo com o perfil de cada pessoa, também se faz necessário dentro do conceito de cidadania financeira ter capacidade para tomar decisões bem informadas e conscientes com relação ao seu uso, complementam outros especialistas no tema.

Contudo, ressalta o BC, para que haja avanço em uma sociedade e seja plena, a cidadania financeira depende da existência de um contexto estruturado. Para isso, questões como inclusão e educação financeira, proteção ao consumidor de serviços financeiros e participação no diálogo sobre o Sistema Financeiro Nacional precisam existir e funcionar de forma organizada. Só assim o cidadão teria melhores condições de vivenciar a cidadania financeira no seu cotidiano.

Como se dá o exercício da cidadania financeira

Na prática, a cidadania financeira pode ser exercida através de quatro princípios que, em conjunto, determinam o contexto ao qual se remete o BC. A propósito, segundo a autoridade monetária, somente o trabalho integrado entre eles é capaz de promover a cidadania financeira em toda a acepção do termo. São eles:

  • Inclusão financeira – significa que o cidadão consegue acessar serviços financeiros adequados às suas necessidades;
  • Proteção do consumidor – o usuário conta com ambiente de negócios confiável, com informação simplificada e com meios para a solução de conflitos;
  • Educação financeira – existe a oportunidade de o cidadão de desenvolver aptidões e autoconfiança para gerenciar adequadamente seus recursos financeiros;
  • Participação – o usuário do sistema financeiro tem canais para que possa participar da discussão sobre o seu funcionamento.

Quem são os agentes de promoção

Segundo o BC, os agentes responsáveis pela promoção da cidadania financeira são:

  • Fornecedores de serviços financeiros: a esses, atribui-se, por exemplo, o papel de oferecer serviços que se adequem às capacidades e aos interesses do perfil do consumidor, levando em conta suas especificidades em todo o processo, desde o desenho do produto até a comercialização e pós-venda. Além disso, espera-se que informem de forma transparente, simples e conveniente o que é relevante para que o cidadão consiga tomar decisões livre e conscientemente, levando em conta diferentes graus de capacidade de compreensão;
  • Varejistas: a eles cabe o papel de deixar clara a diferença de preços entre compras à vista e a prazo e informar de forma simples as características e os riscos das opções de pagamento disponíveis ao cliente. Ademais, deverão favorecer que o consumidor use seus recursos financeiros de forma consciente;
  • Instituições de educação, associações da sociedade civil e imprensa: podem, por exemplo, exercer o papel de divulgar indícios de fraudes ou golpes financeiros; assim como facilitar e encorajar a atenção do cidadão aos direitos e às responsabilidades quanto à contratação e ao uso de serviços financeiros. Também podem fomentar comportamentos favoráveis ao bom gerenciamento dos recursos pessoais;
  • Cidadãos: têm o dever de denunciar às autoridades competentes indícios de fraude ou golpe, irregularidades ou condutas abusivas que podem afetar outros cidadãos e buscar conhecer a atuação dos operadores e reguladores do sistema financeiro e os caminhos para influenciar o debate sobre o tema. Além disso, lhes cabe dar atenção à gestão das finanças pessoais e do crédito, buscando aprender os instrumentos que possam melhorar ou facilitar essa gestão.

A cidadania financeira no Brasil

Em se tratando de Brasil, o BC tem se esforçado para tornar o país uma nação financeiramente capacitada. Desde 2018, a autoridade monetária publica seu Relatório de Cidadania Financeira, atualmente em sua segunda edição. Por meio desse documento, é possível saber os avanços obtidos em território nacional e as estratégias para a implementação e consolidação dessa frente de atuação.

Nesse contexto, o BC tem trabalhado para incluir pessoas no Sistema Financeiro Nacional e torná-las ativamente participativas através da educação financeira, a fim de que a população se sinta preparada para consumir com segurança produtos e serviços financeiros.

No Relatório de Cidadania Financeira lançado em 2021 foi possível identificar que o trabalho tem trazido algum resultado: a parcela da população que mantinha algum relacionamento com instituições financeiras no Brasil chegou a 96% em 2020 – quase dez pontos percentuais acima do registrado três anos antes quando da divulgação do primeiro relatório.

Índice de cidadania financeira

Com o objetivo de acompanhar a evolução da cidadania financeira no Brasil, o BC também utiliza um indicador de abrangência nacional, o Índice de Cidadania Financeira (ICF). A saber, esse índice busca avaliar as principais características das diferentes dimensões da cidadania financeira e convertê-las em uma escala numérica.

De acordo com o ICF, o que se observa é que as diferenças persistem pelo país mesmo que quase a totalidade da população tenha estabelecido algum contato como o sistema financeiro. Para se ter uma ideia, em 2020, dado mais recente, o índice foi de 45,1, contra 43,3 em 2017. Ou seja, o avanço mais qualificado aconteceu, mas ainda foi pequeno.

Olhando-se por região, a situação é ainda mais delicada devido à desigualdade. Enquanto o Distrito Federal (75,6) e o estado de São Paulo (69,9) tiveram os melhores resultados, e todos os estados do Centro-Oeste, Sul e Sudeste alcançaram taxas superiores à média nacional, a situação é diferente no Nordeste e no Norte. No primeiro, apenas o Sergipe (46,6) superou o indicador nacional. Já os estados da região Norte possuem os índices mais baixos de cidadania financeira (entre 15,3 e 27,7). O cenário, portanto, é o de que esforços existem e estão promovendo avanços, mas eles ainda podem ser maiores e mais bem distribuídos.

Fazendo uma análise de como esse processo tem sido desenvolvido, a quarta edição da Carta Propague, intitulada Cidadania Financeira: estratégias para a popularização da Agenda BC#, se debruça sobre a questão e identifica que, “de forma geral, o Brasil acompanha a fronteira internacional em relação às recomendações de organizações internacionais, tendo uma boa variedade de projetos em estágio inicial voltados para a capacitação e segurança do consumidor em meio à modernização do sistema financeiro”.

Principais estratégias e desafios

No que diz respeito às estratégias de inclusão financeira, principalmente digital, aponta a Carta, “o país se destaca graças ao Pix e ao Auxílio Emergencial”. Porém, ressalva que “ainda é preciso identificar as lacunas da infraestrutura e da confiança do consumidor antes de considerar uma atividade inserida no cotidiano do brasileiro”.

Já em termos de capacitação das pessoas, a publicação indica que “a tendência que se destaca [nas ações do BC] é a de diversificar os grupos atendidos pela Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), por enquanto focada em jovens em escolas”. É esperado que o caminho seja o de contemplar novos grupos e locais de atendimento, tendo em vista que o BC mapeou os desafios de cidadania financeira enfrentados especificamente por idosos e microempreendedores.

Ainda de acordo com a Carta Propague, apesar dos avanços do país na promoção da cidadania financeira, vale ter em mente que o cenário está sendo desenhado enquanto a infraestrutura do sistema financeiro brasileiro se moderniza, o que, por sua vez, acaba por trazer dificuldades. Nesse contexto, aponta duas tendências estruturais que merecem acompanhamento. O avanço da tecnologia de 5G e o surgimento de novos produtos via Open Banking, que mesmo dependendo inicialmente de um grau maior de capacidade financeira por parte do usuário, é capaz de trazer ferramentas que diminuam as barreiras de acesso na medida que se desenvolve, sendo uma das apostas do BC para isso.

Veja ainda:

 Confira também o Ebook: Inclusão financeira e o perfil dos excluídos no Brasil, pesquisa realizada por professores da UFRJ em parceria com o Propague.

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