O Rio quer ser um hub de criptomoedas, mas há profissionais qualificados para isso?

Para isso, investir na capacitação de profissionais na área será o diferencial para o sucesso do projeto Rio Crypto. A Austrália, líder em blockchain, pode servir como modelo para o desenvolvimento no setor de criptomoedas aqui no Brasil.
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Amanda Stelitano
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O Rio de Janeiro anunciou o seu plano piloto para transformar a cidade em um hub de tecnologia voltado para criptomoedas. A aposta é vista como positiva para que a cidade se torne uma referência no mercado brasileiro e ajude a alçar o país ao status de hub global, atraindo mais investimentos e criando novos espaços no mercado de trabalho voltados para a área. Mas, para decolar, o projeto do “Crypto Rio” depende de um planejamento para preencher a lacuna de profissionais capacitados em número necessário para a criação do hub de tecnologia. Olhar para experiências estrangeiras que deram certo pode ajudar a encurtar o caminho.

Capacitação em cripto e novas tecnologias como prioridade

Entender que existe uma escassez de qualificação no mercado é, talvez, o passo mais importante para projetar um plano para ser um hub de criptomoedas no cenário internacional. Hoje, pesquisas identificam que, mesmo com o mercado em ascensão e forte demanda, 89% dos recrutadores têm dificuldade de encontrar profissionais com habilidades compatíveis ao nicho. Segundo pesquisa realizada pelo LinkedIn, Singapura, Estados Unidos, Reino Unido e Austrália são hoje os países que mais se destacam na procura por profissionais com habilidades blockchain e, por isso, têm sido os países que, nos últimos anos, se destacaram aos olhos de investidores e empresas do mundo cripto.

Olhando especificamente para o caso brasileiro, o problema se estende por várias áreas do setor de tecnologia. A ausência, hoje, de profissionais capacitados no mercado de trabalho brasileiro para essas áreas reflete diretamente na projeção de desenvolvimento e inovação no país. Um levantamento feito pela startup de ensino e capacitação, Driven, projeta que o país só deve conseguir formar aproximadamente 46 mil profissionais especializados até 2024, enquanto a demanda exige, pelo menos, 420 mil vagas para o setor.

Para que o Brasil acompanhe a lista dos líderes mundiais em cripto e tecnologia, é necessário que programas de capacitação sejam criados o quanto antes. Já existem algumas iniciativas vindas do setor privado focadas em escolas de formação de profissionais no mundo de criptoativos, e parcerias de fintechs e universidades que oferecem cursos de formação para futuros profissionais voltados para tecnologia no setor financeiro. Mas  as iniciativas do setor financeiro e o apoio do governo para essa etapa de qualificação e preparação de profissionais com habilidades compatíveis ainda são claramente insuficientes para suprir esse gap.

O exemplo da Austrália na busca da liderança pelo mercado de blockchain

A Austrália é um bom benchmark de país que está usando o investimento na indústria de criptoativos e suas tecnologias, em especial o blockchain, para o cumprimento dos objetivos da sua agenda de inovação. O país possui uma Estratégia Nacional de Blockchain em curso desde 2019, na qual prospecta um plano com diferentes enfoques de regulação, capacitação, competitividade internacional e colaboração para levar o país à liderança global na área, com a geração e manutenção de empregos como um dos objetivos destacados. Em termos de objetivos, inclusive, a proposta australiana é muito semelhante à do Rio de Janeiro.

Hoje, o país está bem próximo de ser uma liderança global em blockchain e novas tecnologias, abrindo caminho também para avanços no debate de regulação de criptomoedas. A introdução e aceitação de cripto se torna muito mais fácil e menos resistente quando já se tem um sistema familiarizado e adaptado para as tecnologias que suportam as transações financeiras dentro de um sistema descentralizado e transfronteiriço. Os reguladores do país argumentam que regular e promover segurança jurídica para o desenvolvimento do mercado é uma forma de evitar que esses empregos qualificados saiam do país.

Não é de hoje que a Austrália se mostra disposta a preparar esse terreno. A Bolsa de Valores Australiana – ASX – foi pioneira em declarar o uso da tecnologia blockchain em suas transações, antes mesmo do plano de estratégia ser lançado. Planos de prova de conceito e testes de estresse estão sendo continuamente desenvolvidos em parceria com centros de pesquisa e universidades para testar não só a eficácia e praticidade da automatização nas operações de transações de fundos internacionais, mas também se atentar para a aceitação e familiaridade do setor financeiro e seus consumidores no novo processo.

O departamento de Ciência, Indústria, Energia e Recursos da Austrália estima que o retorno da estratégia nacional de investimentos em blockchain e nas tecnologias combinadas, em geração de negócios para o país, pode representar, por ano, aproximadamente US$ 175 bilhões até o ano de 2025, podendo chegar à US$ 3 trilhões em 2030.

O roteiro nacional de blockchain australiano como estudo de caso para a “Crypto Rio”

O projeto nacional de blockchain australiano foca em doze estratégias, organizadas em três áreas principais: Regulamentos e Padrões; Habilidades, Capacitação e Inovação; e Investimento internacional e Colaboração. É possível notar a relevância da questão de qualificação profissional pelo fato de a capacitação ser, por si só, um dos pilares no caminho para se tornar um hub de criptoativos.

Essa importância do desenvolvimento de habilidades focadas em blockchain e da capacitação de novos profissionais é explicitada em 3 pontos de planejamento do roteiro nacional, que busca integrar diferentes partes do setor público e privado, envolvendo empresas e instituições acadêmicas, seguindo a visão de que trabalhar de forma integrada é importante para garantir o sucesso do projeto. Tais pontos são:

  • Criar grupos colaborativos que incluam grupos de trabalho da indústria, do setor de pesquisa e do governo para avançar na análise dos próximos casos de uso;
  • Incentivar que a indústria e as instituições educacionais trabalhem juntas para desenvolver estruturas comuns e conteúdo do curso para qualificação de blockchain;
  • Criar programa de desenvolvimento de capacidades para startups de blockchain australianas.

O esforço de investimento em capacitação de novos profissionais em tecnologias blockchain, portanto, é um estágio fundamental do projeto australiano e isso tem refletido de forma positiva no objetivo final. Respeitando a particularidade de cada país, esse tipo de iniciativa pode ser uma inspiração para projetos nacionais com objetivos semelhantes.

Amanda Stelitano é assistente de pesquisa do Instituto Propague e mestranda em Economia Política Internacional pela UFRJ.

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