A inteligência artificial (IA) promete ser um grande marco tecnológico na história econômica, expandindo as fronteiras da produtividade, trazendo mais rapidez e eficiência para diversas áreas da economia. Contudo, a difusão do seu uso também expande seus riscos, o que tem pressionado as autoridades a se debruçar sobre o debate regulatório.
Criar um ambiente institucional seguro é essencial para se alcançar um bom uso da tecnologia, mas não é o suficiente: é essencial que a IA receba investimento governamental direto para o desenvolvimento de infraestruturas públicas que garantam uma difusão mais equânime dos benefícios deste que parece ser o mais novo choque tecnológico da nossa economia.
Como lidar com os riscos da inteligência artificial
Os riscos associados à inteligência artificial são diversos: questões de cunho ético, como decisões algorítmicas viesadas; preocupações com a privacidade de dados; aumento de fraudes; entre outros. Para lidar com esses riscos, muitos países vêm discutindo regulações para o setor, buscando encontrar mecanismos de responsabilização e de prestação de contas para garantir supervisão sobre o cumprimento de regras e requerimentos.
Mas a IA promete ser mais do que apenas uma nova tecnologia. Dado o seu potencial disruptivo (sobretudo com técnicas de IA generativa e deep learning) a inteligência artificial parece ser um choque tecnológico histórico que vai remodelar o processo produtivo. Isso gera grandes preocupações quanto ao seu possível impacto macroeconômico, especialmente com relação ao futuro do mercado de trabalho e concentração de poder e de riqueza a partir da concentração de propriedade da nova tecnologia.
Essas preocupações estão visíveis, por exemplo, quando se analisa os 5 princípios básicos propostos pela OCDE para uma IA inovadora, confiável e que respeite os direitos humanos. Os dois primeiros princípios tratam de garantir um “crescimento inclusivo, desenvolvimento sustentável e bem-estar”, além de apresentar “valores centrados no ser humano e equidade”.
Para garantir o cumprimento desses princípios, podem ser usados instrumentos regulatórios que estimulem a inovação (como a criação de sandbox) e que coíbam atitudes anticompetitivas. Também é necessário investimento em qualificação de mão-de-obra e normas que garantam o respeito aos direitos humanos fundamentais.
é necessário entender a inteligência artificial como um bem de utilidade pública e estimular o investimento governamental direto para gerar uma infraestrutura tecnológica pública de qualidade que garanta um uso da IA que vise o bem-estar social.
Mas é preciso ir além: é necessário entender a inteligência artificial como um bem de utilidade pública e estimular o investimento governamental direto para gerar uma infraestrutura tecnológica pública de qualidade que garanta um uso da IA que vise o bem-estar social.
Inteligência artificial para o bem-estar social
Em geral, novas tecnologias que geram mais produtividade estimulam melhoras no bem-estar social. Mas, para que isso aconteça, é necessário que haja uma boa distribuição dos benefícios gerados pela nova tecnologia. Caso contrário, a inovação tecnológica pode se mostrar um vetor de concentração de renda e riqueza, gerando, na verdade, uma piora na qualidade de vida dos cidadãos.
Para garantir uma distribuição equânime dos benefícios é primordial que a tecnologia disruptiva seja entendida como um bem de utilidade pública, justificando o investimento público direto em pesquisa e desenvolvimento. Uma infraestrutura tecnológica pública robusta é capaz de direcionar pesquisas para soluções focadas em gerar ganhos de bem-estar social e não apenas benefícios privados.
Além disso, a infraestrutura pública financiada pelo dinheiro do contribuinte pode ser um importante player para promoção de competitividade no setor. O que vemos hoje é um mercado concentrado em poucos players. Nesse sentido, a atuação pública pode ser um concorrente direto, balizando, por exemplo, usos éticos da IA, e também pode ser usada como ambiente de pesquisa para baratear o custo de entrada no mercado.
Assim, para garantir, de fato, uma inteligência artificial comprometida com o bem-estar social e a equidade, o investimento em uma infraestrutura pública tecnológica robusta é tão importante quanto o avanço da regulação.
Morgana Tolentino é pesquisadora do Instituto Propague e doutoranda em economia pela UFRJ.
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