Nos próximos dez anos, entre os cinco principais riscos que ameaçam a estabilidade financeira e determinam o grau de vulnerabilidade do sistema global, quatro estão relacionados ao meio ambiente e à questão climática. Em nível de exposição, o Índice de Riscos Globais de 2022 coloca a América do Norte e Ásia como as regiões que acumulam maior vulnerabilidade e exposição a riscos físicos e impactos estruturais nas cadeias de valor associados a eventos extremos climáticos e desastres naturais.
Considerando que são as regiões onde estão as duas maiores economias globais, EUA e China, que também são dois dos maiores emissores de carbono e gases poluentes, há uma expectativa de destaque de ambos nas ações para mitigação e adaptação dos efeitos das mudanças climáticas.
Um dos pontos de debate que está relacionado a tal esforço de mitigação de riscos ambientais e climáticos onde a participação de EUA e China aparece com força é o financiamento deste processo e o desenvolvimento de um setor financeiro mais verde, impulsionado por projetos e iniciativas de finanças sustentáveis orientadas para a transição de uma economia de baixo carbono e energia mais limpa.
Tanto para os EUA quanto para a China, o fortalecimento de um mercado sustentável financiado por um sistema financeiro estruturado para tais objetivos representa a oportunidade não só de mitigar riscos climáticos e ambientais, mas contribuir para a definição como liderança climática e econômica de impacto.
Em especial, tanto para os EUA quanto para a China, o fortalecimento de um mercado sustentável financiado por um sistema financeiro estruturado para tais objetivos representa a oportunidade não só de mitigar riscos climáticos e ambientais, mas contribuir para a definição como liderança climática e econômica de impacto.
Novos incentivos para o setor de finanças verdes dos EUA
Tendo começado os esforços relacionados à agenda verde com um atraso em relação a outras grandes economias globais, o governo dos Estados Unidos e suas autoridades monetárias têm apresentado uma sequência de projetos e medidas legislativas que buscam consolidar o país na frente das oportunidades geradas pelo novo cenário da economia verde. Mesmo com demora nas movimentações, o mercado de investimentos em segmentos sociais, ambientais e climáticos vêm crescendo de forma expressiva dado o cenário geral. Em 2020, carteiras com ativos sustentáveis somaram 35 trilhões de dólares, enquanto, no mercado de emissão de títulos de dívida sustentável alcançou 1 trilhão de dólares ainda em 2021.
Esses números apontam o potencial de crescimento e o interesse do mercado financeiro, indústrias e de consumidores ativos por projetos e instrumentos financeiros que estejam alinhados à nova tendência financeira sustentável de modo que a atenção à transição para uma economia com baixa emissão de carbono é vista por muitos como uma estratégia de crescimento para além da agenda ambiental. Em uma ação mais recente, aprovaram ainda a “Lei da Redução de Inflação”, considerado o maior pacote de investimento climático da história do país que prevê um investimento de 430 bilhões de dólares em programas voltados para saúde, social e mudanças climáticas, sendo 370 bilhões voltados apenas para o meio ambiente e energia.
Entre as medidas apresentadas, a atenção e incentivo para a construção de uma infraestrutura de produção industrial verde e orientada para a transição energética chamou a atenção de importantes players do mercado nacional e internacional. Através de incentivos tributários e fiscais, a legislação promete impulsionar e priorizar a produção e consumo de produtos e serviços alinhados à baixa emissão de carbono e menor dependência energética. Essas ações somam-se ao aporte de aproximadamente 12 bilhões de dólares disponibilizado pelo pacote climático para promover a infraestrutura necessária de empresas e indústrias acertadas às metas de redução e transição energética até 2030.
O impacto desse projeto de lei e as movimentações das autoridades monetárias dos Estados Unidos para garantir o gerenciamento de risco e a resiliência do sistema financeiro verde é inegável, tanto em escala doméstica quanto em escala internacional. Contudo, essas esforços não parecem ser suficientes para garantir a liderança climática e econômica única dos EUA frente aos demais líderes globais, uma vez que a aproximação do sistema financeiro com o segmento sustentável na exploração de oportunidades financeiras e ambientais vem acontecendo na Ásia há um tempo, especialmente na China, um dos principais hubs de finanças verdes do mundo.
A infraestrutura do mercado verde na China
Reconhecendo sua posição no topo da lista dos principais emissores de carbono e demais gases poluentes no mundo, a China vem desenvolvendo uma infraestrutura de inovação verde ao mesmo passo que se consolida como um dos principais hubs de finanças verdes globais. Hoje, o mercado sustentável chinês é referência regional e internacional, expandindo seu potencial de crescimento em diferentes segmentos da infraestrutura financeira.
A principal contribuição do país no setor financeiro verde se dá no mercado de crédito de carbono chinês, atualmente considerado um dos principais mercados de carbono globais em termos de valor e penetração regional. Potencializado pelo alto volume de emissões nacionais de CO2, os compromissos internacionais de redução e o potencial de crescimento econômico das finanças sustentáveis, a China fortaleceu uma infraestrutura de comércio de créditos de carbono em proporções maiores que o mercado europeu, outra referência global no assunto.
O patamar de referência alcançado pela China também se expande para o mercado de títulos verdes e ativos sustentáveis. Como resultado de um mercado ativo e de alto valor agregado, a estratégia da China em alinhar os requisitos internacionais com seu déficit sustentável tem atraído o olhar de muitos investidores e expandido em grande escala o mercado de títulos verdes domésticos e na região da Ásia. Como resultado disso, em 2021, dos três principais emissores de títulos sustentáveis em volume de dólares no mundo, dois foram chineses, sendo o Banco de Desenvolvimento da China o maior emissor de títulos verdes e climáticos de todo o mercado global.
O esforço de autoridades monetárias e reguladores chineses na promoção de um mercado de ativos financeiros sustentáveis atrativo e transparente tem trazido bons resultados para o setor econômico como um todo. O mercado consolidado de títulos, somado a uma taxonomia verde atualizada e padronizada como boa orientação para investidores aumenta o fluxo de investimentos e potencializa o direcionamento de recursos para setores de indústria e infraestrutura.
Graças a esse volume expressivo de títulos verdes e sustentáveis emitidos pela China nos últimos anos, houve um aumento significativo de projetos de infraestrutura para a transição energética e de transporte financiados pelos fundos associados ao mercado de títulos chinês. Em uma perspectiva comparada ao cenário de retomada verde dos EUA, nota-se, ainda, a diferença do ritmo de desenvolvimento do mercado verde e do financiamento de suas iniciativas e projetos necessários para a transição econômica e energética, uma vez que nos EUA, os novos planos e ações ainda não representam, necessariamente, um fundo de investimentos sustentáveis destinado para a expansão desse novo mercado verde.
Liderança climática vs emissão de carbono: a corrida que beneficia o setor
Em um comparativo claro, os esforços de compensação do alto volume de emissão de carbono e o cumprimento das metas internacionais estabelecidas até 2030 têm sido de alto impacto e predominância tanto na agenda dos Estados Unidos quanto na da China. O panorama de oportunidades geradas pelo segmentos de finanças verdes potencializa a competição pela posição de referência e liderança econômica, política e climática almejada pelas duas grandes potências globais.
Hoje, em uma análise geral, a China – e o continente asiático como um todo – vem sequenciando transformações no setor financeiro sustentável em um ritmo mais acelerado e compatível à urgência exposta pelas mudanças climáticas. A economia chinesa vem construindo uma infraestrutura mais resistente à exposição de riscos climáticos e ambientais há mais tempo, investindo nas finanças verdes como oportunidade de crescimento e alcance das suas metas internacionais.
No entanto, a mais recente tentativa dos EUA de impulsionar seu setor econômico verde e se estabelecer como liderança principal na questão ambiental e climática pode influenciar positivamente o crescimento das cadeias de valor globais pelo cenário de competição entre as duas maiores economias do mundo.
Amanda Stelitano é pesquisadora do Instituto Propague e mestranda em Economia Política Internacional pela UFRJ.
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