Em tramitação desde 2015, o Projeto de Lei (PL) 2303/15, que trata da regulação de criptomoedas, foi aprovado na Câmara dos Deputados. Ao mesmo tempo em que define o que são moedas virtuais, o texto também conceitua a prestação de serviços de ativos virtuais no país, ou seja, as empresas que atuam no setor, bem como destaca quatro pontos fundamentais para o funcionamento desse mercado no Brasil. Depois do aval da Câmara, a proposta seguiu para o Senado, onde aguarda apreciação e a respectiva aprovação e só então vai para a sanção do poder executivo.
De acordo com o Projeto, os ativos virtuais, entre os quais as criptomoedas se classificam, são representações digitais de valor que podem ser negociadas ou transferidas através de meios eletrônicos tanto com o objetivo de realizar pagamentos como com a finalidade de investimento. Nesse ponto, vale ressaltar que essa definição não contempla o Real e nem às moedas oficiais de outros países, assim como pontos de programas de fidelidade e valores mobiliários, a exemplo de ações.
Já no que diz respeito à prestação de serviços de ativos virtuais, o documento expõe que são considerados provedores desse tipo de atividade as empresas que “efetuam a troca, em nome de terceiros, de moedas digitais por moeda nacional ou estrangeira, assim como entre um ou mais ativos virtuais”. E mais: a prestação desses serviços inclui também “a transferência; custódia ou administração desses ativos, mesmo que de instrumentos de controle; e ainda a participação em serviços financeiros e prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou venda de ativos virtuais”.
Nesse contexto, classificam-se aí tanto as exchanges, como são conhecidas as empresas que realizam as trocas de criptomoedas por moedas de uso corrente e vice-versa; e as empresas intermediárias, ou seja, as corretoras que ofertam investimentos por meio de ativos virtuais.
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O que muda com a regulação de criptomoedas
Além de definir o que são ativos virtuais e a prestação de serviços correlatos, o Projeto traz mudanças importantes para o funcionamento desse mercado no Brasil. Ao todo, quatro pontos merecem destaque. Confira a seguir.
1 – Banco central como agente regulador
A saber, um dos maiores destaques do PL 2303/15 é atribuir a um órgão governamental a responsabilidade pela regulação de criptomoedas no Brasil. Embora não especifique exatamente qual deverá ser a instituição, o relator do projeto, deputado Expedito Matos adiantou que esse papel deverá ficar com o Banco Central (BC). Isso ainda não ficou devidamente explicitado no texto, pois trata-se de uma proposta de iniciativa parlamentar. Dessa forma, cabe poder executivo definir qual será.
No entanto, o projeto estabelece as atribuições do órgão regulador. São elas:
- Autorizar o funcionamento, a transferência de controle, dentre outras movimentações acionárias dos prestadores de serviços de ativos virtuais;
- Definir as condições para o exercício de cargos em órgãos estatutários e contratuais dos provedores de serviços;
- Supervisionar o trabalho dos prestadores de serviços;
- Cancelar, seja por meio de ofício ou a pedido, as autorizações de funcionamento; e
- Estabelecer as hipóteses em que as atividades serão incluídas no mercado de câmbio, bem como as que deverão se submeter à legislação em vigor de capitais brasileiros no exterior e capitais estrangeiros em território nacional.
Vale destacar que, quando as regras de regulação de criptomoedas estiverem vigorando, o órgão regulador determinará os critérios para que os prestadores de serviços se adequem à nova legislação.
2 – Com regulação, Código Penal incluirá criptomoedas
Outra questão proposta no texto é o acréscimo no Código Penal de uma nova categoria de estelionato, determinando de quatro a oito anos de detenção e multa a quem organizar, ofertar, distribuir ou gerir carteiras, assim como servir de intermediário em operações que envolvam criptomoedas, valores mobiliários ou qualquer outro ativo financeiro com o intuito de obter vantagens ilícitas em prejuízo alheio. Isso abrange ainda induzir ou manter alguém em erro, mediante artifício, ilusão ou meios fraudulentos.
3 – Crimes de lavagem de dinheiro
A fim de evitar a lavagem de dinheiro, o Projeto classifica crimes realizados por meio de criptomoedas entre aqueles com agravantes de um a dois terços a mais da pena de detenção de três a dez anos, quando praticados repetidas vezes. Nesse sentido, o texto determina que os prestadores de serviços terão que manter registros das operações com o objetivo de repassar informações aos órgãos de fiscalização e combate ao crime organizado e à lavagem de dinheiro.
4 – Diretrizes para o mercado
Por fim, o Projeto de Lei aprovado na Câmara e que seguiu para o Senado define como diretrizes para o devido funcionamento do mercado de ativos virtuais princípios como boas práticas de governança e ainda uma abordagem tendo como base o risco, a segurança da informação e a proteção dos dados pessoais.
Além disso, contempla a proteção e a defesa dos consumidores e demais usuários, bem como, em linha com o que vem sendo feito internacionalmente, a prevenção à lavagem de dinheiro, ao financiamento do terrorismo e ao crescimento do uso de armas e destruição em massa.
A regulação de criptomoedas no Brasil e o cenário internacional
Para o deputado federal Aureo Ribeiro, autor do Projeto, a falta de regulação de criptomoedas coloca sob risco de fraude os mais de R$ 127 bilhões transacionados por meio dessas moedas virtuais no país, tendo como base dados da Receita Federal. Daí, afirma o parlamentar, a necessidade de regulação.
Ademais, o relator do projeto Expedito Matos acrescenta que o texto aprovado na Câmara é importante porque além de defender as criptomoedas, tem como propósito tornar esse mercado mais seguro e abrangente, valorizando o investimento de quem nele aposta.
Apesar do avanço recente aqui no Brasil, o cenário internacional de regulação de criptomoedas evidencia que o debate não é linear, uniforme e muito menos simples, de modo que até a aprovação final do projeto e sanção do Executivo, não há garantias sobre o resultado do processo, ainda que haja uma tendência clara de que sejam criadas regras. É o que aponta a terceira edição da Carta Propague, relatório periódico para acompanhamento e análise das tendências regulatórias para o sistema financeiro e o mercado de pagamentos.
A justificativa, expõe a publicação, é de que esse ainda é um debate inicial e, principalmente, por haver diferentes graus de compreensão sobre o objeto a ser regulado, o que faz com que países tenham dificuldades de articular denominadores comuns entre os agentes.
Entre as dificuldades identificadas estão a conceituação de criptomoeda e critpoativos em geral, em função dos usos e os desafios regulatórios serem diferentes entre cada classe de produtos; a dificuldade de responsabilização devido a descentralização das tecnologias nas quais elas estão baseadas e a consequente eliminação de autoridades centrais nesse processo. Sem contar, explica, que uma regulação equivocada poderia ter efeitos reversos, criando mais incertezas no mercado.
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