O cenário de regulação do setor financeiro no Brasil começa o ano de 2023 com duas grandes novidades. A primeira delas é a implementação da lei que regulamenta a negociação de criptomoedas no país, sancionada no final de 2022. A segunda diz respeito ao plano bienal de supervisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) baseada em riscos para 2023 e 2024. Na agenda constam comissões temáticas para tratar exclusivamente da atuação dos influenciadores digitais, de ações ESG e criptoativos.
Segundo comunicado à imprensa, os três temas exigirão a atuação de várias superintendências técnicas que deverão trabalhar em conjunto com a Superintendência de Supervisão de Riscos Estratégicos da CVM.
Além da cobertura dessas novas áreas, alguns dos riscos que foram prioridade no plano bienal de 2021/2022 permanecem na agenda da autarquia. A saber, riscos relativos ao mercado marginal; a operações com partes relacionadas e à prevenção e combate à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo, assim como à proliferação de armas de destruição em massa.
Publicado em 21 de dezembro de 2022, o plano bienal da CVM 2023/2024 destaca em sua estrutura, além dos cenários de risco, ações para promover a eficiência e a integridade do mercado mobiliário.
Como o plano bienal da CVM pretende acompanhar os influenciadores digitais de finanças
A principal novidade dessa edição do plano bienal da CVM são as supervisões temáticas. Dentre elas se destaca a de influenciadores digitais que falam sobre finanças. A criação dessa supervisão é resultado da crescente utilização das redes sociais por investidores e do impacto sobre a tomada de decisão de investimentos com base no conteúdo nelas veiculado.
Segundo estudo da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), o alcance desses influenciadores já atinge 74 milhões de brasileiros.
Para monitorar a atividade, a CVM utilizará ferramentas automatizadas e de inteligência artificial, a fim de ter subsídios para eventuais decisões que julgue pertinentes tomar.
Nesse sentido, a proposta é acompanhar a participação dos influenciadores nas ofertas públicas de ações, pois pode haver possível vínculo com ofertantes ou intermediários, representando, assim, conflito de interesses.
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Além disso, a CVM também vai atuar com base em reclamações, denúncias ou fatos publicamente constatados.
Ao mesmo tempo, a linguagem usada nos conteúdos veiculados nas mídias sociais é outro objeto de análise, ainda que existam advertências de que não se trata de recomendação de investimento. A ideia aqui é dar total transparência aos conteúdos patrocinados e evitar mensagens que comprovem a tentativa de convencer o público a investir.
Ainda conforme a autarquia, a supervisão terá caráter preliminar. Até porque ela entende que o monitoramento dos influenciadores digitais deverá passar por várias fases de aprendizado e consequentes ajustes até o fim do biênio.
Só então a CVM acredita que o processo estará ajustado no sentido de identificar desvios de conduta ou se eles vêm avançando no âmbito de regulação da autarquia, onde para atuar precisariam de registro.
Para esse trabalho, a Supervisão de Riscos Estratégicos atuará junto com as superintendências de Supervisão de Investidores Institucionais, Relações com o Mercado e Intermediários e Registros de Valores Mobiliários.
Os objetivos da supervisão em ESG
Outra supervisão temática do plano bienal da CVM para o período 2023/2024 é a de ações ESG, sigla em inglês para ambiental, social e governança. Nessa área, o regulador tem como objetivo acompanhar a evolução do tema no cenário tanto nacional como internacional.
A expectativa é de que seja avaliado o preenchimento das informações exigidas nos formulários de referência do órgão a partir de 2023. Ainda mais que, no ano que passou, ocorreram modificações na Resolução 59, que dita as regras desses documentos, com a CVM passando a exigir mais informações ESG das companhias listadas em bolsa a partir de 2023.
Para o regulador, essa avaliação das informações contidas nos formulários de referência vai permitir que se alcance melhorias na qualidade do conteúdo e se possa ajudar o investidor na tomada de decisão.
Ademais, uma vez com esse novo processo em prática, a autarquia acredita que terá condições de analisar se será preciso definir mais regras relacionadas ao tema. Até porque a CVM está em busca de subsídios para participar de consultas públicas no âmbito de ações ESG em fóruns no exterior.
Para atingir esses objetivos, a autarquia deve envolver o trabalho das superintendências de Supervisão e Riscos Estratégicos, Relações com Empresas, de Investidores Institucionais e de Normas Contábeis e de Auditoria.
O que o plano bienal da CVM diz sobre os criptoativos
Finalmente, ainda entre as novidades do plano bienal da CVM 2023/2024 está a supervisão de criptoativos. Nesse quesito, a autarquia vai analisar, em especial, as ofertas não registradas de security tokens distribuídos pelas principais corretoras de criptoativos. A saber, esses tokens são títulos convencionais digitalizados, podendo representar inclusive ações.
Desse modo, explica a CVM, a ideia é avaliar se a oferta desses criptoativos se configura como Contrato de Investimento Coletivo (CIC), instrumento por meio do qual um determinado número de investidores formaliza a captação de recursos com o objetivo de financiar projetos específicos ou empresas de seu interesse. Se afirmativo, a operação entra no âmbito de regulação da autarquia.
Aliás, segundo o órgão regulador, têm aparecido várias consultas e reclamações sobre a possibilidade de determinada oferta de security token se caracterizar como valor mobiliário.
Para realizar esse acompanhamento a Superintendência de Supervisão de Riscos Estratégicos contará com o suporte da Superintendência de Supervisão de Securitização.
Ademais, vale lembrar que antes da divulgação do plano bienal da CVM, a autarquia havia emitido, em outubro de 2022, um parecer sobre criptoativos, contendo orientações sobre o tema.
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