Criptomoedas no Brasil têm regulação sancionada: e agora, o que se pode esperar?

Além da definição do órgão que vai fiscalizar o mercado, saiba o que mais muda e como o país se insere no cenário global de regulação cripto, considerando que a Europa vinha assumido a liderança até então.
Criptomoedas no Brasil têm regulação aprovada: e agora, o que se pode esperar?
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Equipe Propague
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Publicada no Diário Oficial da União (DOU) em 21 de dezembro de 2022, a lei que regulamenta a negociação de criptomoedas no Brasil passa a vigorar em um prazo de 180 dias contados desde o dia 22 do mesmo mês. A saber esse período corresponde ao tempo que o mercado e as instituições têm para se adaptarem às novas regras, conforme dita o Projeto de Lei (PL) 4.401/21, aprovado no Congresso.

A saber, a aprovação no Parlamento ocorreu no finalzinho de novembro, com o texto, sendo enviado, logo em seguida, para a sanção presidencial. Contudo, como o poder executivo não se manifestou dentro do prazo legal, a matéria sofreu sanção tácita, ou seja, foi aprovada sem veto por falta de resposta do então Presidente da República, conforme determina o Artigo 66 da Constituição de 1988.

O PL também previa que o Presidente da República deveria designar um órgão ou autoridade pública para regulamentar os pormenores. O que acabou não acontecendo. De qualquer forma, o esperado é que a posição de regulador das criptomoedas no Brasil fique a cargo do Banco Central. Portanto, esta é uma das primeiras mudanças para ficar atento.

Pressão internacional pela regulação

Ademais, a sanção da regulação de criptomoedas no Brasil chega em meio à um período turbulento para o mercado de criptoativos. Afinal, desde que aconteceu o colapso da stablecoin Terra/Luna à recente falência da exchange FTX, a pressão para a regulamentação dessas moedas digitais em todo o mundo só cresce.

Organismos internacionais, como o Conselho de Estabilidade Financeira (FSB), por exemplo, que monitora o Sistema Financeiro Global, sobretudo do G-20, que reúne as 20 maiores economias do mundo, anunciou que pretende apesentar propostas, entre elas uma supervisão mais rígida, para orientar os países na regulação desse mercado.

Ao mesmo tempo, o Banco de Compensações Internacionais (BIS), chegou a defender que o futuro do sistema monetário passa pelas moedas digitais de banco central (CBDCs) e não pelas criptomoedas, dada à sua volatilidade, dentre outras falhas, como base monetária.

Dessa forma, ponto positivo para o nosso país, ao se adiantar e aprovar uma regulação de criptomoedas no Brasil antes mesmo da União Europeia (UE), onde se esperava um movimento pioneiro nesse sentido. A saber, esperada ainda para 2022, o Parlamento Europeu considerou que a votação da Regulação de Mercados de Criptoativos Europeu (MiCA) precisa aguardar um pouco mais. Assim, o Brasil tende a ser um dos primeiros países com alguma regulamentação do setor.

Quem vai supervisionar o mercado de criptomoedas no Brasil?

Dois órgãos estão cotados para dar as diretrizes e supervisionar o mercado de criptomoedas no país: o Banco Central (BC) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Até agora, o BC não apresentou qualquer manifestação a esse respeito. Por outro lado, no dia seguinte à aprovação do PL 4.401/21, a CVM publicou uma nota afirmando que poderá ser o órgão que assumirá a responsabilidade pela regulação desses criptoativos quando eles se enquadrarem na categoria de valores mobiliários.

De qualquer forma, independentemente de quem assumir o controle, será esse órgão fiscalizador que vai estabelecer as normas e acompanhar o prazo para que as empresas do setor de criptomoedas se adequem à nova regulação.

Além do acompanhamento desse prazo, outras atribuições do órgão serão:

  • aprovar o funcionamento das empresas do setor, bem como transferência de controle e de ações e a revogação das autorizações;
  • estabelecer as circunstâncias para o exercício de cargos em órgãos estatutários e contratuais nas prestadoras de serviços de criptoativos;
  • inspecionar e fiscalizar quem opera no mercado de criptomoedas;
  • definir os casos em que as atividades podem ser inseridas no mercado de câmbio ou se necessitam ser submetidas a outro tipo de regulação, a exemplo de capitais tanto brasileiros no exterior e como de estrangeiros no Brasil.

Regulação de criptomoedas no Brasil foca mais nas empresas do que nos ativos

Outro aspecto importante acerca do texto sobre a regulação de criptomoedas no Brasil, é que, de forma generalizada, a nova legislação concentra-se mais em supervisionar as empresas propriamente ditas e os serviços inerentes aos ativos criptográficos do que regular esses ativos. Dessa maneira, o que se pode esperar de novidade para o setor no país é o que segue:

  • punições para crimes que envolvam criptoativos, como esquemas de pirâmide, lavagem de dinheiro, estelionato, entre outras situações em que se procure tirar vantagens financeiras. Nesse sentido, o texto prevê uma pena entre dois e seis anos e uma multa. Portanto, uma garantia de proteção para quem adquire criptomoedas;
  • empresas estrangeiras que operam no setor precisam ter sede no Brasil. Ou seja, precisam ter um CNPJ regularizado;
  • licença obrigatória para provedores de serviços virtuais. Assim, essa regra abrange as corretoras de criptomoedas e demais empresas que trabalham na intermediação na comercialização destes ativos. Assim, para funcionar, as empresas necessitam da autorização do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF); e
  • incentivo à mineração sustentável, pois o PL propõe isentar de imposto de importação os computadores voltados para mineração de criptomoedas, caso a atividade seja baseada em fontes renováveis de energia.

De todo modo, avaliam os especialistas, independentemente do foco, não se pode deixar de destacar os pontos positivos da nova legislação, como segurança jurídica, promovendo, consequentemente, a expansão do mercado cripto no Brasil; concorrência mais justa, dada as exigências para operação nesse setor no país; e estímulo à inovação financeira e geração de mais postos de trabalho.

O que ainda precisa ser aprimorado

Entretanto, o texto de regulação de criptomoedas no Brasil parece deixar de fora uma questão fundamental que ainda merece atenção para o melhor funcionamento e a segurança desse mercado no país: a segregação patrimonial.

Isto significa que, por enquanto, fica de fora da nova legislação esse mecanismo, que nada mais é do que a separação dos recursos financeiros dos clientes do caixa das empresas.

A saber, essa separação é uma forma de dar mais proteção ao público caso aconteça algum problema financeiro com os provedores de serviços criptográficos, assegurando assim os ativos dos clientes, como por exemplo em caso de falência da empresa.

Ministério Público pretende estudar regulação de criptomoedas no Brasil

Um dia antes da aprovação da regulação de criptomoedas no Brasil pelo Congresso, o Ministério Público Federal (MPF) anunciou a implementação de um grupo de trabalho para estudar o tema. A medida foi publicada no Diário Oficial da União, considerando uma portaria do MPF.

Ou seja, mesmo com a sanção presidencial, ao que tudo indica, esse grupo de trabalho pretende, até meados de 2023, produzir um relatório, primeiramente parcial, das suas ações. Na sequência, ao longo dos seis meses seguintes, outro documento será elaborado resumindo todas as ações e os resultados do estudo.

De acordo com o MPF, o objetivo é apresentar o que ele está chamando de boas práticas de atuação do órgão no que diz respeito às criptomoedas.

Ainda segundo o Ministério, o grupo foi proposto pelo presidente do Conselho Nacional do Ministério Público, no caso o procurador-geral da República, Augusto Aras, para os quais foram nomeados dez promotores e procuradores para interagir com a equipe. Além disso, o grupo de trabalho atuará em conjunto com a Comissão de Defesa da Probidade Administrativa do MPF.

Criptomoedas no Brasil: país sai na frente da Europa na regulação

Com a sanção da regulação de criptomoedas no Brasil, o país sai na frente no cenário global no que tange a leis específicas para esse mercado.

Até então, o projeto de regulação do mercado cripto pela União Europeia, mais conhecido como MiCA, em caso de sucesso, poderia ser referência global, posicionando a Europa no epicentro do debate acerca da questão, servindo, assim, como benchmark para muitos países.

Até porque o processo se encontrava em estágio bastante avançado. Na verdade, o texto já havia sido aprovado pela Comissão Europeia e estava aguardando apenas a votação final no Parlamento Europeu. Porém, o Parlamento adiou a votação do Mica pelo menos até fevereiro de 2023 por considerar o documento muito extenso e complexo para ser aprovado apressadamente.

Conforme análise publicada pelo Instituto Propague, certamente a decisão não agradou o mercado de criptomoedas, assim como algumas autoridades financeiras. Contudo, a avaliação que se faz é que, tendo em vista a dinâmica legislativa da UE e o conjunto de processos necessários envolvendo o Parlamento e o Conselho europeus para, finalmente, poder protocolar a aprovação da legislação, justifica a ansiedade do mercado.

Aliás, vale ressaltar que esse adiamento na votação afeta tanto a data em que a lei final seria publicada, mas também o período em que ela começaria a entrar em vigor. Afinal, o MiCA prevê o início de aplicação total em todas as esferas cripto somente 18 meses depois da aprovação legislativa final.

Contudo, o que parece é que as autoridades europeias querem minimizar os riscos de divergência e reprovação dos parlamentares, mesmo que para isso tenham que modificar o calendário original a ter que enfrentar maior resistência sobre o texto.

Regulação de criptomoedas no Brasil marca ponto frente a UE na questão ambiental

Quando se compara o desenrolar da regulação de criptomoedas no Brasil com o cenário europeu, um outro aspecto chama a atenção: o esverdeamento da economia envolvendo as atividades do mercado cripto.

Enquanto a UE desiste da proibição do proof of work na mineração das criptomoedas, o que pode atrasar a agenda de esverdeamento da economia no continente, a nova legislação brasileira pretende incentivar a mineração sustentável, isentando de imposto de importação os computadores voltados para mineração de criptomoedas, se a atividade utilizar fontes renováveis de energia.

Cooperação internacional deve ser considerada

Finalmente, é preciso ficar atento a outro aspecto: independentemente da aprovação de uma regulação de criptomoedas seja no Brasil ou na Europa, vale considerar a importância de uma sinergia internacional na regulação desse mercado a fim de evitar arbitragens regulatórias.

Essa situação acontece à medida que um agente do mercado muda a jurisdição da sua atividade em busca de um mercado com regras mais brandas, fugindo, assim, das restrições impostas no seu local de origem.

Portanto, procurar combater a arbitragem regulatória é mais um desafio, principalmente considerando a sua operação descentralizada, o que significa um alcance transnacional.

 

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