Enquanto as autoridades da China e potencialmente da Rússia proíbem a participação dos cidadãos nas finanças descentralizadas (DeFi na sigla em inglês), outros países parecem mais propensos a regular o setor. Caminhar nessa direção pode provocar uma segmentação, levando a uma vertente regulamentada do DeFi, mais passível de aceitação no mercado, e a outra mais inovadora, porém não regulada.
Essa é a visão da Fitch Ratings, uma das três maiores agências globais de classificação de risco de crédito, em seu estudo “Primer on DeFi: Risks and Regulations” (Cartilha sobre DeFi: Riscos e Regulamentações, na tradução livre). Fazem a ressalva, no entanto, que essa abordagem é preliminar, podendo evoluir à medida que haja maior compreensão dos riscos, guiada por considerações regulatórias e legais.
Nesse sentido, a agência espera que muitos provedores se submetam à regulamentação do DeFi, com o intuito de apoiar sua credibilidade no mercado. Porém, destacam, alguns poderão continuar a operar fora de ecossistemas baseados em regras para que possam ser mais inovadores.
Para saber mais, confira Tecnologia DeFi: o que é e como funciona as finanças descentralizadas
Em direção ao DeFi 2.0
Na avaliação da Fitch, o que vem acontecendo é que o setor de DeFi tem se caracterizado por mudanças rápidas, com protocolos continuamente atualizados. E apesar da falta de supervisão regulatória, “há evidências de autorregulação à medida que os protocolos evoluem, com aplicativos descentralizados populares incorporando salvaguardas e, em alguns casos, cumprindo os requisitos regulatórios e de licenciamento locais”.
Contudo, embora a regulamentação e as leis possam trazer segurança e estabilidade ao DeFi, bem como ao espaço de ativos digitais como um todo, a agência considera que alguns projetos podem ter que mudar seus serviços à medida que novas regras são criadas. Nessa direção, a Fitch argumenta que aceitar a supervisão regulatória pode prejudicar a composição e a interligação dos protocolos DeFi existentes, o que significa que alguns serviços DeFi podem não estar em conformidade.
Dessa forma, concluem que as restrições resultantes de uma autorregulação ou regulação impostas podem eventualmente levar o setor DeFi a se bifurcar, surgindo um DeFi 2.0. Segundo a agência, esse segmento seria mais regulamentado e atenderia os requisitos das autoridades, atraindo contrapartes institucionais e corporativas.
Enquanto isso, um DeFi não regulamentado continuaria existindo, sendo acessado por meio de redes privadas virtuais e carteiras anônimas, oferecendo níveis potenciais mais altos de recompensas, mas com um nível de risco assumidamente mais alto.
Existe risco para o sistema financeiro?
A fim de embasar uma possível segmentação do DeFi em setores regulados e não regulados, o documento publicado pela Fitch Ratings dedica uma seção aos riscos que as redes descentralizadas podem trazer para o sistema.
Segundo a agência, o DeFi é particularmente vulnerável a crimes cibernéticos, golpes e manipulação de mercado. Nesse ponto, ela destaca que a ameaça mais potencial é conhecida como “rug pull” (puxar o tapete, na tradução direta), em que os desenvolvedores abandonam projetos e pegam fundos dos usuários. Ao mesmo tempo, também predominam o phishing e os bugs de código. Sem esquecer da manipulação de preços de token. “Desse modo, a imaturidade do setor provavelmente levará a novas explorações e riscos”, concluem.
Contudo, calculam que o DeFi ainda apresenta riscos limitados para o sistema financeiro convencional. Isso porque “exceto pelas stablecoins, o DeFi ainda é amplamente separado e ainda não sistêmico em tamanho”. O estudo exemplifica essa questão destacando que o valor total bloqueado em DeFi (valor em dólares de todas as garantias depositadas nas plataformas) já havia chegado a US$ 180 bilhões em janeiro de 2022. Tal valor está bem acima dos US$ 22 bilhões no início de 2021, mas o crescimento mensal está desacelerando.
Ainda assim, fazem a ressalva que à medida que essa tecnologia se expandir e amadurecer, espera-se que seus vínculos com o sistema financeiro aumentem. “Com o tempo, isso levaria a um aumento do risco sistêmico do DeFi para o sistema convencional”, acrescentou.
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