Finanças verdes crescem na Ásia, mas gerenciamento de dados é um desafio

O uso de dados para a tomada de decisão no setor financeiro tem se tornado uma prática cada vez mais comum. Porém, em finanças sustentáveis, a disponibilidade e acesso a esses dados ainda é um desafio, por isso, autoridades e organizações começam a agir para mudar o cenário. Veja como o Banco da Malásia e o Instituto para Pesquisa Monetária e Financeira de Hong Kong tem atuado.
Finanças verdes crescem na Ásia, mas gerenciamento de dados é um desafio
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Equipe Propague
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O enfrentamento das mudanças climáticas entrou de vez na agenda do mundo corporativo, criando desafios e oportunidades para o setor financeiro, particularmente no que diz respeito a integração das considerações climáticas em estratégias de negócios, operações, gerenciamento de riscos e dados para finanças verdes.

Esse movimento se deve, em parte, ao envolvimento de reguladores e organizações internacionais que se mobilizaram para facilitar a atuação de instituições financeiras na medição e gerenciamento dos riscos. Além disso, com a degradação do clima, investidores começaram a demandar produtos financeiros que auxiliassem a transição para uma economia sustentável e equilibrada.

A Ásia, em especial, tem se tornado um importante mercado. De acordo com a empresa de consultoria Mckinsey, apenas no pacífico asiático, mais de 15 países e 670 empresas estabeleceram metas de redução de emissões, criando, assim, oportunidades de investimento com o potencial de destravar um mercado entre US$ 4 trilhões e US$ 5 trilhões até 2030.

A despeito desse avanço nos últimos anos, alguns desafios estão limitando a atuação plena de instituições financeiras no enfrentamento das mudanças climáticas. Os desafios predominantes, em geral, envolvem a disponibilidade, confiabilidade e complexidade dos dados relacionados ao clima, juntamente com a falta de abordagens e conhecimentos padronizados sobre a organização desses dados.

Nesse quesito, o sudeste asiático tem se destacado nos esforços de padronização e disponibilidade de dados e informações. Entre várias intervenções direcionadas à solucionar esse problema de interoperabilidade e acessibilidade com os dados necessários, uma das ações com maior mobilização foi a de publicação de um  um documento organizado pelo ASEAN com diretrizes sobre taxonomia verde, conforme mostrou o Instituto Propague.

Desde 2022, quando esse documento foi publicado, algumas regiões têm conquistado relevância no assunto ao registrarem movimentações e feitos direcionados a minimizar a barreira de dados verdes e avançar no desenvolvimento de um cenário favorável às finanças sustentáveis. Dentre os países da região asiática, Malásia e Hong Kong tem apresentado projetos de valor significativo para o cenário verde.

A Malásia tem feito esforços em uma direção parecida à padronização do ASEAN, reforçando a tendência regional ao lançar um documento investigando possíveis lacunas (granularidade, acessibilidade) nos dados disponíveis no país.

Já Hong Kong, um importante parceiro comercial do bloco do ASEAN, está se tornando um hub regional de finanças verdes, impulsionado, entre outras coisas, pelos laços estreitos com o sistema financeiro da China, principal mercado de títulos verdes na Ásia. Esse cenário, naturalmente, tem trazido desafios e oportunidades na cidade-nação, como no caso do gerenciamento de dados sustentáveis.

Gerenciamento de dados é vital para a tomada de decisão das instituições financeiras

Vale lembrar que a disponibilidade de dados climáticos e ambientais de boa qualidade é crucial para o setor financeiro, pois permite que as instituições acompanhem os seus progressos e de terceiros no apoio a transição para uma economia sustentável.

A viabilidade dos dados retrospectivos, por exemplo, pode servir para empresas, organizações e instituições dos mais variados setores definirem de forma factível metas futuras de emissão e estimarem o quanto se tem emitido. Esse tipo de projeção pode auxiliar os investidores a entenderem o grau de comprometimento e exposição de uma entidade em relação aos riscos climáticos e ambientais.

Do ponto de vista dos reguladores e supervisores do sistema financeiro, o acesso à dados transparentes possibilita a verificação dos requisitos de conformidade e prevenção a prática de greenwashing. Muitas empresas e fundos captam recursos se comprometendo com metas e objetivos sustentáveis, mas, nem sempre, os recursos são aplicados de forma adequada.

Nesse sentido, os dados sustentáveis servem como base para a tomada de decisão das instituições financeiras, tanto na escolha de investimentos e financiamento de projetos associados aos objetivos de desenvolvimento e transição sustentável, quanto para a identificação de empresas associadas que possam se tornar riscos futuros.

Ao tornar o gerenciamento de dados uma prática comum e necessária, os dados se tornam um ativo estratégico que possibilita a previsão e minimização de instabilidades no setor e orienta deliberações assertivas e alinhadas aos objetivos de cada instituição.

Hong Kong avança no gerenciamento de dados para riscos climáticos e ambientais

Compreendendo esse cenário e as dificuldades enfrentadas pelo setor financeiro, o Instituto para Pesquisa Monetária e Financeira de Hong Kong lançou um documento que explora os desafios da medição de riscos associados ao meio ambiente. O relatório introduz uma estrutura consultiva de gerenciamento de dados voltada para essa temática.

O objetivo de publicação desse documento é o de conscientizar a necessidade de gerenciamento de dados sustentáveis como ferramenta auxiliadora de medição dos riscos climáticos e ambientais. Dessa forma, a estrutura proposta é formada por quatro elementos-chave:

Governança de dados

Diz respeito ao controle, planejamento e monitoramento de dados.  Essa etapa enfatiza as regras, os papéis, os processos e as tecnologias dentro da organização para garantir o uso adequado das informações.

Gerenciamento do ciclo de vida dos dados

Especifica as regras e os procedimentos do gerenciamento de dados ao longo de sua vida útil, garantindo que uma organização implemente as políticas corretas em cada estágio do ciclo. Isto é, coleta, armazenagem, utilização e descarte.

Gerenciamento de metadados

São “dados sobre dados” e ajudam uma organização a entender o conteúdo e o contexto de cada uma das informações disponíveis, como por exemplo, o título, o formato do arquivo além do método e a hora em que foram criados.

Gerenciamento da qualidade dos dados

Engloba o desenvolvimento de padrões de qualidade e conformidade, a identificação dos responsáveis pelas informações, a comunicação e o compartilhamento dos resultados das avaliações de qualidade.

Lacunas e barreiras no acesso à informação podem ser superadas através do gerenciamento de dados

Um dos objetivos de inserir um gerenciamento de dados na cultura de atuação de empresas e organizações é poder identificar de forma mais rápida e assertiva as lacunas que impedem uma coleta, armazenamento e distribuição de dados sustentáveis nas economias.

Pensando nisso, o Banco Central da Malásia (BNM) lançou um relatório sobre a catalogação de dados para identificar falhas nos dados já existentes em circulação no país.  Em geral, os gaps procurados pelas autoridades se referiam a tópicos como falta de granularidade das divisões e categorias das informações, acessibilidade e padronização dos materiais.

A iniciativa contou com assistência técnica do Banco Mundial e foi realizada pela Joint Committee on Climate Change (JC3) do BNM, a partir dos esforços empreendidos por um subcomitê estabelecido em julho de 2021 que, além de identificar essas lacunas, o subcomitê foi encarregado de explorar possíveis soluções e recomendações para resolvê-las.

Nesse sentido, então, o catálogo foi projetado como uma estratégia para promover a conscientização sobre gaps existentes, servindo de apelo e orientação para que os provedores de dados melhorassem a disponibilidade e a acessibilidade das informações.

Além disso, as descobertas feitas na elaboração do catálogo servirão de base e referência para os provedores de dados adotarem definições e padrões comuns, promoverem plataformas de informações interoperáveis e avançarem em uma política de dados abertos. Espera-se que, a longo prazo, isso melhore a disponibilidade e a comparabilidade de dados sustentáveis.

Importante destacar, também, que a iniciativa pretende influenciar organismos públicos, já que há a expectativa de que o documento abra caminho para a criação de novos catálogos/bases de dados de dados climáticos e ambientais a nível nacional por parte das agências governamentais relevantes.

Entenda como o Banco Central da Malásia identificou as barreiras de acessibilidade nos dados existentes

Depois da avaliação, foram identificadas lacunas importantes para a utilização das informações já coletadas, baseadas na abordagem de identificação de necessidades de dados centrada no usuário da Rede de Esverdeamento do Sistema Financeiro (NGFS), segundo a qual as partes interessadas identificarão os casos de uso aplicáveis, seguidos por métricas e itens de dados.

Os casos de uso compreendem tópicos como dados para modelagem macroeconômica, decisões de investimento e desenvolvimento de produtos. Já os tipos de métricas dizem respeito a medições como valor das emissões de CO2 ou sensibilidade da transição que, no fundo, reflete o custo de ajuste para uma economia de baixo carbono.

Já os itens de dados correspondem a granularidade dos dados, ou seja, ao grau de detalhamento das informações coletadas. Ao todo, o projeto identificou 143 itens de dados que foram agrupados em 8 grupos maiores como emissões de GEE, empréstimos verdes e títulos verdes, e energia.

Assim, seguindo essa metodologia de gerenciamento de dados, o relatório tenta identificar quais dados estão disponíveis parcialmente ou totalmente e quais ainda não estão disponíveis.

O projeto identificou também que, na Malásia, de todos os itens de dados selecionados, apenas 49% estão disponíveis. Desse total, apenas 18% estão disponíveis de forma imediata, sem necessidade de solicitação. Além disso, 18% sofrem de falta de granularidade, ou seja, estão faltando indicações complementares sobre localização ou setor econômico a que os dados se referem.

O relatório atestou, ainda, que desses 49%, 11% requerem, no mínimo, algum tipo de assinatura paga para acessar. E, entre os 51% dos itens de dados restantes, 11% não são divulgados devido a restrições de confidencialidade.

Seguindo a classificação por tipo de métrica, os dados com maior grau de indisponibilidade foram aqueles classificados como alinhamento (67%) e que se referem, por exemplo, aos planos para atingir neutralidade de carbono enviados às autoridades.

Ao agrupar os 143 itens de dados em oito grupos maiores, foi identificado que as áreas com maior ausência de dados são consumo e gerenciamento de águas (56%), VaR dos ativos (50%) e energia (47%).

 

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