Pagamentos internacionais sem o dólar americano avançam na Ásia

Após as sanções contra Rússia, diversos países lançaram iniciativas para liquidações internacionais em outras moedas que não o dólar americano. Este foi o caso da China e da Índia. Alguns países do ASEAN, entretanto, estão usando novos mecanismos de pagamentos internacionais para acelerar o comercio regional.
Pagamentos internacionais sem o dólar americano avançam na Ásia
Data
Autor
Equipe Propague
Produto
Compartilhar

Com a guerra da Ucrânia resultando em sanções contra a Rússia, diversos países começaram a buscar alternativas financeiras para liquidação de pagamentos internacionais. Nesse contexto, o CIPS da China ganhou destaque na mídia internacional como uma possível alternativa contra as restrições.

Essa tendência, entretanto, já tinha começado antes mesmo do conflito. No fim de 2021, por exemplo, o Banco Popular da China assinou um acordo com o BIS para estabelecer um esquema de liquidação em yuan envolvendo os bancos centrais da Indonésia, Malásia, Hong Kong, Singapura e Chile.

Outro país que têm apostado nesse movimento, seja para ser menos suscetível a eventuais sanções ou para desenvolver o comércio bilateral de modo a diminuir a dependência do dólar, é a Índia. Nesse sentido, o Banco Central da Índia instituiu um novo mecanismo para permitir a liquidação de transações internacionais em Rupia Indiana (INR).

Além disso, Índia e Indonésia tem trabalhado para desenvolver uma plataforma de liquidação bilateral. Seguindo a mesma direção, diversos Banco centrais do Ásia lançaram uma iniciativa para uma plataforma de pagamentos internacionais por Qr-code, o projeto envolve Indonésia, Malásia, Filipinas, Singapura e Tailândia.

Assim, como o movimento em direção à busca por alternativas ao dólar como moeda de referência para liquidação de pagamentos internacionais tem se mostrado uma tendência regional, cabe olhar com mais calma para as iniciativas em andamento.

Índia anunciou mecanismo para liquidação de pagamentos internacionais em Rupias

O Banco da Reserva da Índia (RBI) anunciou no dia 11 de julho de 2022 que os pagamentos internacionais com outros países, incluindo o Sri Lanka e a Rússia, poderiam ser feitos na sua moeda doméstica Rupia (INR).

O novo mecanismo permite o faturamento, pagamento e liquidação de exportações e importações em INR. De acordo com o RBI, o objetivo é promover o comércio global com ênfase nas exportações da Índia e incentivar o interesse da comunidade internacional pela Rupia Indiana.

Mas como serão liquidadas essas transações?

Nessa nova configuração, as exportações e importações serão denominadas e faturadas em Rupia Indiana, sendo que a taxa de câmbio a ser adotada é a taxa de mercado. O Banco destaca que não há mudança na documentação necessária para os bens importados e exportados.

Quais os requisitos legais?

É necessário que o banco indiano autorizado a fazer esse tipo de transação abra uma conta especial para o correspondente bancário estrangeiro. Assim, no caso das importações, o pagamento em INR será creditado em tal contal. Já as exportações serão liquidadas a partir do saldo em Rupias na conta especial designada ao correspondente bancário do país parceiro.

É importante ressaltar que os bancos autorizados que desejem adotar esse mecanismo devem, primeiro, buscar aprovação prévia do Departamento de Câmbio da RBI. A partir disso, o banco estrangeiro pode se aproximar do banco local autorizado para a abertura da conta.

Por fim, o RBI destaca que é de responsabilidade dos bancos locais garantir que o banco correspondente não seja de um país ou jurisdição que conste na Declaração Pública atualizada da Força-Tarefa de Ação Financeira (GAFI) sobre Jurisdições de Alto Risco e Não Cooperativas.

Índia e Indonésia trabalham em plataforma para transações internacionais

Além da iniciativa para liquidação de pagamentos internacionais em Rúpia, o RBI tem trabalho para impulsionar as relações bilaterais. Nesse sentido, assinou, junto ao Banco Indonésia (BI), um memorando para a colaboração entre as duas instituições.

Com este documento, o RBI e o BI comprometeram-se a aprofundar as relações entre os bancos centrais por meio do compartilhamento de informações e cooperação em áreas como sistemas de pagamento, inovação digital, marco regulatório e fiscalização.

A expectativa é que os dois países possam acelerar a conectividade para pagamentos internacionais diretamente entre as duas instituições. O memorando estabelece que os dois bancos centrais se envolvam rotineiramente em discussões sobre tendências financeiras e econômicas e promovam colaboração técnica por meio de treinamentos e seminários conjuntos para investigar a criação de vínculos de pagamento transfronteiriços de varejo.

Integração no ASEAN para pagamentos internacionais via QR code

Seguindo essa tendência de integração regional, o Banco Indonésia, o Banco Negara da Malásia, o Banco Central das Filipinas, a Autoridade Monetária de Singapura e o Banco da Tailândia anunciaram que estão trabalhando na integração de seus sistemas nacionais de pagamento sob a Iniciativa de Conectividade de Pagamentos ASEAN.

O objetivo do projeto é permitir que os residentes de cada país possam fazer pagamentos baseados em QR Code em seus aplicativos bancários móveis sem que essas transações precisem passar por alguma moeda intermediária, como dólar a ou o euro.

Na verdade, o uso de QR Code em transações desse tipo não é tão recente assim. Em junho de 2021, o Banco Negara da Malásia e o Banco da Tailândia já possuíam pagamentos transfronteiriços em tempo real via QR Code entre os dois países. Singapura, também, já estava ligada à infraestrutura tailandesa desde setembro de 2021.

O movimento atual, entretanto, abre caminho para uma homogeneização dos pagamentos móveis instantâneos em QR Code de forma direta em todo o Sudeste Asiático. A expectativa é que essa conectividade de pagamento fortaleça ainda mais laços econômicos entre os países da ASEAN e apoie a recuperação do comércio regional após a pandemia.

Além dos pagamentos: China avança na estratégia de internacionalização da sua moeda na Ásia

As iniciativas, no entanto, não se limitam à criação de estruturas para liquidação de pagamentos em moedas locais. A China, em especial, tem avançado na sua iniciativa de internacionalização da própria moeda, que já tem ganhado força na Ásia para pagamentos internacionais, na composição de ativos dos Bancos Centrais.

O Banco Central do país assinou um acordo com o BIS como parte dos planos de Pequim de estabelecer um sistema de reservas de liquidez em yuan. O projeto envolve os bancos centras da Indonésia, Malásia, Hong Kong, Singapura e Chile. Entretanto, há a expectativa de novos signatários.

Esse sistema tem como objetivo fornecer suporte de liquidez para os bancos centrais participantes durante períodos de volatilidade do mercado. O estabelecimento do acordo veio em um momento de aumento da demanda internacional pela moeda chinesa.

Seguindo essa tendência, diversos países estão elevando suas reservas de yuan. Israel, aliado histórico dos EUA, por exemplo, anunciou em abril de 2022 a intenção de elevar a participação do yuan na sua reserva, reduzindo os percentuais de dólar e euro.

Vale lembrar que, em dezembro de 2021, a China já havia assinado um acordo para o yuan fosse aceito como moeda oficial no território do Myanmar. Essa iniciativa significou um avanço na internacionalização da moeda chinesa entre os países da ASEAN.

Tais movimentos não significam necessariamente que a posição chinesa chega a ameaçar o status do dólar como moeda internacional de referência, mas aponta para um papel regional relevante que tem sido construído nos últimos anos e precisa ser acompanhado.

 

Leia mais:

Transferências internacionais: Malásia e Singapura testam pagamentos em tempo real

Transferências internacionais têm carteira digital como nova aliada na Ásia

O colapso das Stablecoins: reações na Ásia

Open Finance em Singapura e o impacto no mercado asiático

Todos os produtos

Quer se
aprofundar mais?

Com uma linguagem simples de entender, as análises do Instituto Propague vão te deixar por dentro dos principais temas do mercado.

Leia agora!